domingo, 4 de abril de 2010

Tensão e derrapadas

Qual é o grande trunfo do PT? Fazer um governo de bons resultados. Qual parece ser uma angústia existencial do partido?

Alon Feuerwerker

Notei aqui outro dia haver algo de artificial no ambiente de radicalização discursiva na política brasileira nestes tempos. É como se os políticos girassem numa rotação e a sociedade em outra. A imagem é antiga, do tempo do disco de vinil, mas serve.
Na teoria, a polarização deveria estar conectada a algum esgarçamento social, sensível ou latente.

A mobilizações explícitas ou a projetos tão distantes que a disputa entre eles implicasse alternativas dramaticamente antagônicas no desenho da economia, da política e da organização da sociedade.

Um exemplo foi o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) decretado no fim do ano passado pelo presidente da República.

Alguém mais distraído poderá imaginar ter sido bolado mais ou menos assim. Um dia Luiz Inácio Lula da Silva chamou os auxiliares mais diretos e ordenou: “Arrumem aí um projeto qualquer que provoque bastante confusão e me crie problemas com todo mundo. Mas, olhem lá, com todo mundo mesmo”.

Por que o governo precisou recuar tão rápida e desorganizadamente no PNDH? Porque o programa não correspondia a uma demanda com massa crítica social. Não era uma pauta com apoio expressivo, não era uma agenda nem de longe majoritária. Soou mais como produção intelectual feita nos carpetes. Um arroubo de voluntarismo.

Daí que a ideia tenha sido trucidada com certa facilidade, apesar da altíssima popularidade do presidente.

Já um Barack Obama em baixa reuniu forças para, na véspera da eleição parlamentar, fazer o Congresso dos Estados Unidos aprovar a reforma da Saúde, ideia que vinha sendo responsável por importantes derrotas recentes dos partidários do presidente.

Obama conseguiu fazer a base social dele prevalecer sobre a base política. Talvez algumas dificuldades de Lula nasçam da tentação de fazer o caminho oposto: usar o amplo, mas difuso, apoio social reunido por ele e pelo governo para impulsionar iniciativas com viés mais político-ideológico, e para as quais o cidadão médio não está nem aí. E, portanto, para as quais o Congresso tende a não estar nem aí.

Qual é o grande trunfo do PT? Fazer um governo de bons resultados. Qual parece ser uma angústia existencial do partido? Que outros talvez pudessem ter feito esse mesmo governo, alcançando resultados semelhantes.

Isso não deveria ser um problema maior, pois na vida real quem dirige este governo é o PT, e não outros. Mas o discurso da legenda está todinho montado na necessidade imperiosa de o partido continuar no poder para o país não voltar ao passado, não andar para trás, não pôr a perder as conquistas dos últimos anos.

Essa tensão talvez seja causa de algumas derrapagens, como foi o caso do PNDH. Movimentos políticos que propiciam contra-ataques adversários com chance de sucesso.

Nem rascunho

Por falar em discurso, o PT está preparadinho e ajeitadinho para enfrentar o PSDB. Mas não tem até agora nem rascunho do que dizer para se contrapor a Marina Silva (PV), ou mesmo a Ciro Gomes (PSB), na hipótese de ele ser candidato.

Curiosidade

O PT e o governo talvez imaginassem que a situação eleitoral estaria algo mais vantajosa nesta altura, e isso levaria as disputas regionais a se resolverem quase por gravidade.

Há ainda muitíssimo tempo para as coisas se encaixarem, mas alguns fatos acenderam a luz amarela em cabeças mais frias no campo governista. Um deles é o PT ter roído a corda na aliança com os Sarney no Maranhão. Outro são as dificuldades para unificar a base em torno de um único nome no Amazonas, onde Lula colocou larguíssima vantagem sobre Geraldo Alckmin em 2006.

Outra ainda são situações de aparente fortalecimento da oposição no Centro-Oeste.

Dilma precisa ir muito bem no Norte e no Centro-Oeste para não depender em excesso dos votos no Nordeste. Onde aparece uma curiosidade.

O ex-prefeito de João Pessoa Ricardo Coutinho (PSB) tem com ele o PSDB e o DEM para desafiar o governador José Maranhão, que herdou a cadeira depois da cassação do tucano Cássio Cunha Lima.

Como em Natal (RN) dois anos atrás, monta-se na Paraíba uma coalizão encabeçada por um aliado de Lula e apoiada por adversários do presidente, para enfrentar a aliança PT-PMDB. Se vai ganhar é outra história, mas não deixa de abrir brecha para o projeto nacional da oposição.

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