terça-feira, 26 de julho de 2011

O advogado e o juiz

 Autor: TARCISIO VALERIANO DOS PASSOS
Quando a maioria dos acadêmicos de direito conclui o curso, entende que está apta a mudar o mundo, pois o vê de pernas pro lar. Tudo parece estar completamente errado. Na condição de advogado a primeira instituição a ser mudada é o judiciário, onde irá militar diariamente. Onde já se viu uma ação durar até vinte anos? Começa por aí.
José bacharelou-se em direito ainda jovem. Seu pai que era fazendeiro bancou tudo para ele. Boa universidade, bons hotéis, bons carros. Jamais daria conta de ir de coletivo para a universidade.
Aprovado no exame de ordem da OAB foi advogar na cidade onde nasceu e se criou. Imediatamente começou a criticar tudo, pois, achava tudo errado. Os servidores não tinham capacidade para o cargo que ocupavam. Ele conheceu a todos trabalhando na enxada em chácaras aos arredores da cidade, antes de irem trabalhar no fórum. No seu modo de ver, eles não entendiam de papéis e nem de relação interpessoal; mesmo assim estavam lidando com coisas da justiça.
Criticava os advogado antigos da cidade por não tomar atitude contra o péssimo  funcionamento da justiça. Onde já se viu advogado ficar esperando nos corredores do fórum até duas horas para ter sua audiência realizada? Ah! Eu não fico, dizia ele. Aguardo quinze minutos, se a audiência não começar, pego uma certidão e vou embora e ainda comunico a corregedoria.
Os advogados veteranos lhe davam corda, dizendo que ele tinha razão, que continuasse na luta pela mudança das coisas. Certamente um dia conseguiria reverter a situação.
Certa manhã, o Dr. José chegou ao fórum e pediu para falar com o juiz. A atendente depois de entrar no gabinete, retornou ao seu posto e disse ao Dr. José, que esperasse um pouco, o magistrado iria atendê-lo.
Logo a seguir foram chegando mais advogados e o Dr. José começou a reclamar.
 Como pode, estou aqui há dez minutos e até agora o juiz ainda não me recebeu? Isso não pode continuar. Devemos juntar nossas forças e reclamar. Se não formos atendidos, o jeito é formarmos uma comissão e nos dirigirmos ao tribunal para reclamar ao seu presidente. Será que o juiz pensa que não temos mais o que fazer? Ainda hoje tenho que viajar trezentos quilômetros para comprar uma boiada. Para mim dez minutos faz a diferença.
Os colegas olhavam uns para os outros com ar de reprovação, mas permaneciam silenciosos. Todos, por serem advogados calejados e experientes, haviam aprendido ao longo das batalhas forenses que a paciência era a melhor arma que dispunham.
Depois de quarenta minutos a atendente do magistrado franqueou a entrada ao Dr. José dizendo que o magistrado pediu que ele entrasse.
Mal havia entrado no gabinete do magistrado, o Dr. José começou a esbravejar, dizendo que estava decepcionado com o tratamento que vinha recebendo da justiça. Advogava naquela comarca há mais de dez anos e nada havia mudado. Estava sempre esperando pela boa vontade de todos.
Naquele instante o magistrado numa polidez que lhe era peculiar, se levantou e foi ao seu encontro. Após cumprimentá-lo pegando em sua mão solicitou-lhe que se sentasse, colocando uma cadeira à sua disposição.
 O senhor aceita um cafezinho? – Perguntou o magistrado.
 Não.  Respondeu secamente o Dr. José.
 Um copo de água?
 Também não. Sabe doutor, estou exausto. Acabei de receber de Vossa Excelência um chá de cadeira de quarenta minutos...
Quando o Dr. José ia dar continuidade ao seu arrazoado, o magistrado pediu licença e disse: Doutor, peço desculpas por haver-lhe feito esperar todo esse tempo. Mas acontece que neste momento eu estava sentenciando uma ação de um cliente seu. Determinei na decisão que fosse expedido ainda hoje mandado de reintegração dele na posse de sua fazenda. Estudei este processo praticamente a noite toda, para poder sentenciá-lo esta manhã, por isso demorei atendê-lo.
Ao ouvir aquela notícia, o Dr. José se levantou rapidamente da cadeira onde estava sentado e pálido de vergonha, pediu desculpas ao magistrado, saindo do gabinete pensando seriamente em rever muita coisa na sua carreira de advogado.

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